quinta-feira

ANOITECEU

é noite...
sucumbe no manto cinzento
a agonia do crepúsculo ausente.
é noite...
em que rastros pútrefos do silêncio
são pingos estranhos de chuva.
é noite...
sombras gargalham mudas
no chão umidecido do quarto.
é noite...
soluçam permeio as paredes ocas
os fantasmas da vaguidão.
é noite...
e noite é dia anoitecido
de tanta noite tendo amanhecido!


terça-feira

O CHEIRO DA SUA EXISTÊNCIA

Quando teu hálito mistura-se ao meu,
Fluindo docemente entre nossos lábios.
Sinto na proximidade de tuas narinas,
O cheiro misterioso da sua existência.

Querendo absorvê-lo na ânsia de descobrir-lhe,
Inspiro o ar que tu expiras,
E um eflúvio enigmático resvala garganta abaixo,
Asfixiando meus desejos insanos.

Abro meus olhos, de amor umedecidos,
E os teus entreabertos a velar meus lábios,
Afogam-se no oceânico de nossas salivas.

E então, deslizo meus beijos até seu ouvido,
E sussurrando o vapor tépido de minha existência,
Deixo sua língua desvendar-lhe meus segredos!



quarta-feira

A ALMA

Em sonhos, ruminando caminhos de estradas cósmicas,
Abre-se o véu dos reluzentes filamentos de energia.
Em que desligar-se do agora é ligar-se no universo,
E flutuar no espaço é expandir a força dos chakras.

Continue no jardim apinhado de flores espirituais.
Abarque em teu seio o eflúvio que remonta teus passados,
E baile com as pétalas douradas no presente do futuro,
Até avistares o miraculoso crepúsculo prenho.

O beija-flor ao pegar carona com a brisa do alvorecer,
Estremece-se ao tocar a face rubra de sua amada,
E sentir que as gotas de orvalho brotam ainda de seus olhos.
Num pranto de eternas vidas, de amor sem fim...

E os sonhos trêmulos permanecem,
Nas raízes de teu corpo, nos filamentos de sua mente.
Devorando os resquícios, cuspindo os amargos,
De tua caminhada, de seu tempo, de sua alma.




OLHAR DE UM DESCONHECIDO

Teu olhar penetrou-me e atravessou-me,
Como uma onda que encharca e depois arrasta.
Arrastou-me para perto de ti,
Ou para o que penso ser perto de ti.
Não lhe conheço!
Mas a intensidade com que teus olhos me olham,
Dispensa qualquer tipo de conhecimento.
Ainda me olha do escuro.
Sei, porque apenas teus olhos brilham,
Atraindo os meus que me escapam.
Em que lugar e tempo será que se encontram?
Posso sentir, quando em palpitações,
Solto meu olhar para alcançar o seu.
E eles bailam, na intensa dança do desejo.
Já lhe conheço!
Teu olhar quando me atravessa,
Sussurra segredos seus, ainda que envolvidos por mistérios...
Amo olhar-te!
Amo quando me olhas!
É como seu eu fosse o infinito do seu silêncio.
É como se eu fosse as fendas de um céu estrelado.
Olhar que se fixa na distância da luz e se perde na ausência dela.
Olhar cometa que risca o espaço,
E deixa uma sensação de inalcançável.
Olhares...
O que dizem um para o outro?